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Sobre Viver e Morrer

29 de agosto de 2019

Há momentos em que temos muito pouco a dizer.
Embora, se espere de nós educadores, alguma palavra… Ela é muito difícil de ser dita.

Diante da crueza com que as mortes no mundo estão ocorrendo e com a mesma crueza que estão sendo divulgadas, me pergunto: O que estas mortes significam neste momento da caminhada humana? Em todos os lugares do mundo, apesar de anos de civilidade, encontramos pessoas matando pessoas, pelos mais diversos motivos; e pessoas colocando sua vida em risco, também por motivos variados. Vivemos em constante contradição! A contradição faz parte da vida humana, da nossa vida, porém, quando ela é congelada nos seus opostos há muito pouco a ser feito e então nos resta apenas duas possibilidades: viver ou morrer; e, se quiserem de outro ponto de vista, matar ou morrer. Temos aprendido durante toda a História da Humanidade que os opostos, as diferenças, a diversidade podem resultar em transformação. A tese e a antítese podem produzir uma síntese e a síntese será sempre um avanço em relação à tese e à antítese. Podemos escolher morrer defendendo a “nossa” tese…

Podemos escolher morrer defendendo “nossa” antítese… Podemos escolher não produzir articulações possíveis em direção à vida.
Durante toda a História da Humanidade nos deparamos com vários momentos em que temos que assumir um lado, lutar pelas ideias que representam aquele lado, até às últimas consequências. Isso é louvável, porém dependendo da forma como o fazemos alimentamos a cristalização dos opostos: riqueza/pobreza; feminino/masculino; poder/submissão; ter/ser; bem/mal; alegria/tristeza; rapidez/lentidão; ganhar/perder e tantos outros ouvidos a todo instante nos poucos diálogos que conseguimos produzir e em todas as ofensas e humilhações que conseguimos fazer quando assumimos um dos lados, sem, em nenhum momento, poder se colocar no lugar do outro. Chegou a hora de considerarmos esses aparentes opostos como unidades que fazem parte de nós como indivíduos e dos contextos dos quais fazemos parte. Todos, temos contidos em nós, o bem e o mal; todos os contextos e situações possuem aspectos positivos e negativos. Todos, temos um pouco de vítimas e um pouco de algoz. Todos, podemos assumir o poder, ou nos submeter e assim por diante…
Depende, também, do complexo movimento em que estamos mergulhados. Quando percebermos que vida e morte fazem parte de uma mesma unidade podemos buscar entender o que as mortes, em excesso e desnecessárias, no mundo atual podem significar. O que estas mortes representam? O que elas querem nos dizer? O que a vida humilhada, desgastada, desrespeitada, desafiada a cada notícia, a cada conquista perdida pode significar? Jogos são formas simbólicas que nos ajudam a entender o movimento da vida, principalmente aqueles que não compreendemos de pronto. Desde os primórdios da humanidade eles nos ajudam a compreender, também, a relação entre viver e morrer. Muitas vezes, ajudam a articular os elementos desta contradição e outras vezes, conforme são apresentados e vivenciados, ajudam a fazer a manutenção desta contradição. E assim vamos aprendendo coisas do tipo: se mato, vivo e ganho o jogo; se morro é porque esse era o destino por ter sido fraco e submisso e por não saber me defender, e perco… E se matar o outro é inconcebível, então me mato.

Assim, se delineia no horizonte dos jogos o jogo da Baleia Azul, um jogo no qual ganha quem morre, não simbolicamente, mas concretamente. A minha pergunta é: O que este jogo quer simbolizar no contexto mundial? Quando eu escolho sair da contradição ganhar ou perder para viver a unidade ganhar/perder ao mesmo tempo? Ganho o jogo e perco a vida… Ou seja, para ganhar o jogo coloco minha vida em risco. Estamos vivendo uma crise de autoridade em todos os níveis. As crianças estão cada vez mais longe de seus pais, em creches e escolas que abrem das seis horas da manhã à noite; nossos governantes, desgovernados parecem estar jogando o jogo da Baleia Azul com todos nós. Colocam-nos desafios diários e não deixam saídas. Perdemos nossos empregos e não conseguimos outros; somos substituídos por máquinas e ficamos subtraídos da nossa possibilidade de fazer… De ganhar… De produzir… E de amar. Ficamos reduzidos a assistentes dos mecanismos corruptos de enriquecimento, muitas vezes, sem poder consumir o básico por falta de condições dignas, anteriormente obtidas por meio do trabalho. Sem trabalho, sem dinheiro, sem condições de novas atividades, num mundo capitalista, sem horizontes, resta-nos enlouquecer ou nos revoltar. Será isso que este jogo deseja nos mostrar? Talvez as mortes dos imigrantes, impedidos de circular pelo mundo, de se defender, de buscar novas saídas; as mortes dos filhos da ditadura coreana e outras tantas; de sírios e judeus que lutam incessantemente por terras que os identifiquem como cidadãos do mundo; daqueles que experimentam fenômenos da natureza arrebatadores; daqueles que roubam para alimentar seus filhos; daqueles que se subjugam ao tráfico; e outras tantas, possam ser compreendidas como diferentes fases de um grande jogo que vem nos lembrar o quão importante é a compaixão, a convivência, o cuidado amoroso, como disse Isabel Parolin no dia 19/04/2017 nas redes sociais, e a Ética de ser Humano. Falta-nos algo que perdemos pelo caminho, mas que poderemos reconquistar – o Amor como resultado da articulação entre os opostos. Não é preciso perder vida para articulá-los. Temos que entender que enquanto lutamos para congelar opostos não abrimos espaço para o entendimento. Não se trata disso ou daquilo; de viver ou de morrer; de ser rico ou ser pobre; trata-se do caminho que existe entre os dois pontos e da possibilidade de chegarmos a um terceiro ponto que não seja nem “isso”, nem “aquilo”, mas que contenha “isso” e “aquilo” transformado em anúncio de algo melhor para TODOS!

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